02/07/2007 |

A Moda Athos

Depois das colunas do Alvorada que enfeitaram fachadas de casa, nos anos 60, foram logotipo de carro (o Uno Mille) e até hoje desfilam em pára-choque de caminhão, agora outro símbolo de Brasília virou objeto cult: os azulejos de Athos Bulcão.

por Conceição Freitas - Correio Brasiliense


Depois das colunas do Alvorada que enfeitaram fachadas de casa, nos anos 60, foram logotipo de carro (o Uno Mille) e até hoje desfilam em pára-choque de caminhão, agora outro símbolo de Brasília virou objeto cult: os azulejos de Athos Bulcão. Os traços do artista estão em camisetas, pratos, xícaras, sandálias — Athos da cabeça aos pés, aos milhares.

Já faz algum tempo que os painéis de Athos viraram prova de bom gosto e enfeitam casas nos bairros nobres da cidade. O Piantella, restaurante dos políticos, dos poderosos e dos que querem sê-lo, reformou suas instalações e reapareceu com um painel do artista. O recém- inaugurado Oliver, restaurante do circuito da alta gastronomia, acariciou seus primeiros clientes com um pratocuja estamparia era de Athos. Mimo que o freguês pôde levar para casa.

O corre-e-compra do Dia das Mães motivou dois shoppings a oferecer como brinde aos seus clientes peças com o traço do artista Athos — está tão na moda que está sendo falsificado, como denunciou no início do ano Nahima Maciel, repórter do caderno C do Correio. Azulejos com desenhos da estrela e da pomba, reproduções falsas da obra que reveste as fachadas laterais da Igrejinha, estão sendo vendidos em lojas que se dizem antiquários.

A moda Athos na parede, no peito, no pé e na cozinha bem que podia lançar seus benefícios para os painéis que há muito pedem proteção. São mais de cem espalhados pela cidade. A obra mais vistosa é a fachada lateral do Teatro Nacional, os volumes geométricos que passam a maior parte do tempo sujos de ferrugem e sem manutenção. Aos 88 anos, suportando pacientemente o Mal de Parkinson, Athos Bulcão não fez apenas azulejos. Seus desenhos flutuantes no papel, suas composições de foto e gravura (uma delas, a que me vem à memória, de um erotismo devorador) são de deixar a gente orgulhosa de viver na mesma cidade que ele, no mesmo tempo histórico que ele. De saber que ele mora logo ali, na Asa Sul. E de até bem pouco tempo ter o privilégio de cruzar com ele pelaí. A fã quase querendo beijar seus pés e ele com seu sorriso tímido, constrangido e de algum modo se sentindo invadido — com toda a razão. Diante dos tímidos e  reservados, toda discrição é pouca.

Que bom poder dizer aos filhos e netos, aos parentes distantes e aos visitantes: Athos Bulcão passou lápis de cor na cidade onde a gente mora. Transformou paredes em obras de arte, conseguiu fazer integrar arquitetura e arte plástica, como queria Oscar Niemeyer, o responsável pela vinda do artista para Brasília.

Contar pra eles que em 1962, Athos Bulcão inventou árvores de Natal para a W3 Sul. Eram prismas superpostos. Em cima deles, estrelas natalinas e  elas hastes cheias de brinquedos pendurados. Num dia determinado, as crianças puderam pegar os brinquedos. Arrancá-los das árvores por si só foi uma grande festa.

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Crônica publicada no jornal Correio Braziliense do dia 1 de maio de 2007, por Conceição Freitas


 


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